Para não escrever muitas besteiras, resolvi ler o Projeto de Lei
21/2014, que trata do Marco Civil da Internet. Já aprovado pela Câmara e Senado,
hoje (23.04) o referido Projeto foi sancionado pela Presidente Dilma Rousseff, sem a exclusão de nenhum dos artigos votados anteriormente.
Sobre o conteúdo, o Projeto apresenta pontos positivos e negativos, os
quais já foram amplamente expostos pelos veículos de comunicação. No entanto,
existe uma situação que chama a atenção quando se faz uma leitura um pouco mais detalhada: a Seção III, que trata da responsabilidade
de danos decorrentes de conteúdo gerados por terceiros.
Vou trazer a redação abaixo para que todos tirem suas próprias conclusões:
Seção III
Da Responsabilidade por Danos Decorrentes de
Conteúdo Gerado por Terceiros
Art. 18. O provedor de conexão à internet
não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado
por terceiros.
Art. 19. Com o intuito de assegurar a
liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de
internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes
de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar
as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro
do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente,
ressalvadas as disposições legais em contrário.
§ 1º. A ordem judicial de que trata o caput
deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica d
conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do
material.
§2º. A aplicação do disposto neste artigo
para infrações a direitos de autor ou a direitos conexos depende de previsão
legal específica, que deverá respeitar a liberdade de expressão e demais
garantias previstas no art. 5º da Constituição Federal.
§ 3º. As causas que versem sobre
ressarcimento por danos decorrentes de conteúdos disponibilizados na internet
relacionados à honra, à reputação ou a direitos de personalidade bem como sobre
a indisposição desses conteúdos por provedores de aplicações de internet
poderão ser apresentadas perante os juizados especiais.
§ 4º. O juiz, inclusive no procedimento
previsto no §3º, poderá antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela
pretendida no pedido inicial, existindo prova inequívoca do fato e considerado
o interesse da coletividade na disponibilização do conteúdo na internet, desde
que presentes os requisitos de verossimilhança da alegação do autor e fundado
receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
Inicialmente, o artigo 18 do Projeto cita que os provedores de internet não serão
culpados por conteúdo gerado por terceiros, o que é sem dúvida ótimo. Não faz o
mínimo sentido que o cedente do espaço para publicações de terceiros seja responsabilizado
por um conteúdo irresponsável postado por qualquer um dos seus usuários.
No entanto, o artigo 19 traz
uma redação no mínimo perigosa, principalmente em seus §§ 3º e 4º, pois é ali que o Projeto abre exceções para as possibilidades em que os provedores de internet sejam responsabilizados pelos conteúdos publicados, principalmente em caso de descumprimento de decisão judicial que requeira a exclusão do material considerado ofensivo por terceiro.
O perigo está na possibilidade da utilização de juizados especiais por qualquer um que se sinta prejudicado, e que este solicite a exclusão de qualquer material publicado na internet. Juizados Especiais são utilizados para causas de valores de no máximo até 20 salários mínimos, sendo que nessa instância, o requerente pode fazer o pedido diretamente ao juiz, sem maiores burocracias. E acordo com o § 4º, o juiz pode inclusive decretar a tutela
antecipada ao pedido, ou seja, o material alvo da discussão pode ser retirado da internet antes mesmo que a parte
requerida se manifeste.
Agora pergunto: estamos em época de pré-eleições. A julgar pelos
vínculos escusos entre políticos e juízes, que é fato notório não de hoje, parágrafos
como os 3º e 4º do art. 19 podem efetivamente beneficiar determinados políticos, com a possibilidade de exclusão quase que imediata de materiais que possam ser considerados prejudiciais às suas imagem. E aí, como ficamos?
Não estamos falando de valores de indenizações ou coisas correlatas, estamos falando simplesmente de exclusão rápida e eficaz de material lícito, mas que de alguma forma possa prejudicar a imagem de determinado político interessado nas próximas eleições.
Será esse o motivo de tanta pressa para a aprovação do Marco Civil?
Sinceramente, é de se espantar a celeridade que o Senado deu para a votação
desse Projeto de Lei. A justificativa da apresentação do conteúdo em um congresso realizado em São Paulo não convence muito, ainda mais em se tratando do
atual governo, mergulhado atualmente em um mar de acusações sem fim.
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